elektro papos


taxar Cahora Bassa

extracto da entrevista da Ministra do Plano e Finanças de Moçambique (Luísa Diogo) ao semanário Savana (24 Outubro 2003)


a Hidro-Eléctrica de Cahora-Bassa (HCB) regressou ao destaque noticioso

e, no espaço de uma semana, dois ministros moçambicanos disseram de suas justiças.


a 24 de Outubro - numa entrevista ao semanário Savana - Luísa Diogo, Ministra do Plano e Finanças de Moçambique, reiterou o papel vital do empreendimento e a necessidade de uma restruturação accionista da HCB como primeira alavanca para quaisquer desenvolvimentos no vale do Zambeze.


antecipando desenvolvimentos positivos, Luísa Diogo confirma um contacto com Manuela Ferreira Leite (Ministra das Finanças de Portugal) descrevendo-o como "muito bom" e referiu que, na sequência dos últimos contactos entre os dois accionistas - Moçambique (18%) e Portugal (82%) - "há entendimento quanto à noção de solidariedade em relação à dívida da HCB".


Em contraste com o tom tranquilamente parcimonioso de Luísa Diogo, uma semana depois o Ministro da Energia (e Recursos Minerais) dissertou longamente sobre a HCB. Num briefing à imprensa (30 Outubro), o ministro moçambicano achou necessário voltar a historiar extensivamente o acordo de 1975 e, na sequência de uma densa digressão sobre tarifas eléctricas, ele lamentou-se quanto às dificuldades a que faz face na negociação de pequenos incrementos de potência para Moçambique - tipo 50 MW.


após um inusitado ataque aos ambientalistas, que o questionam quanto à oportunidade de Mphanda Nkuwa - uma mega-barragem hidro-eléctrica projectada para o Zambeze - o ministro admitiu que paira uma "situação de indefinição" sobre o projecto.


Incidentalmente, a racionalidade desta exuberância hidro-eléctrica não mereceu comentários substantivos por parte da autoridade, pelo que o longo briefing ministerial de pouco serviu para aclarar os méritos e deméritos de Mphanda Nkuwa. O ministro moçambicano confirmou no entanto o que desde há muito se sabia: ninguém investe num mega-projecto que tem ao lado um outro em situação indefinida.


Já quanto ao modo como se poderá definir este indefinido - ou seja, a restruturação accionista da HCB - o ministro optou por uma linguagem futebolística referindo que "neste momento, a bola está do lado de Portugal". Questionado sobre o assunto, o ministro confessou não conhecer os detalhes de uma eventual venda das acções portuguesas da HCB a grupos privados.


tal como, provavelmente, o ministro, eu também gostaria de conhecer o específico destes segredos. Por natural curiosidade certamente, mas sobretudo para afastar alguns fantasmas que de quando em quando me visitam.


isto porque, a propósito das acções portuguesas da HCB, num dia destes dei comigo emboscado entre definições do que são, ou não, grupos privados. E, mau grado a nebulosidade que ultimamente tem afectado a semântica negocial, pude no entanto concluir que, no caso HCB, nenhuma definição poderia incluir outros estados, ou outras empresas estatais estrangeiras - e a caminho de privatizações, como por exemplo em França, África do Sul ou Portugal. E nem sequer bancos detidos por outros estados.


É que, se assim fosse, de novo se desvirtuaria o sentido de soberania sobre a HCB.


e aqui recordo os conselhos do meu colega Vitor Fernandes - a restruturação accionista da HCB só pode ser feita a favor do Estado de Moçambique. E esta será a única entidade que, eventualmente, poderá proceder ao leilão do todo ou de partes deste valioso bloco energético.


Entretanto, e para que se constitua o bolo de 400 milhões de euros que a HCB vale, eu novamente concordo com Vitor Fernandes quando ele sugere que, desde já, o Estado de Moçambique passe a taxar o caudal de água turbinada em Cahora-Bassa Sul.


for starters, ao ritmo de  $ 0.1 USD por decâmetro cúbico.


curiosamente, da última vez que nos cruzámos, Vitor Fernandes chamou-me a atenção para um facto singular. Pela primeira vez na longa estória deste nó em Cahora-Bassa, o dossier é gerido por duas reputadas damas das finanças públicas. E, para quem como eu conhece a sua sabedoria na gestão da casa pública, há uma secreta esperança que, desta vez, a coisa avance.


no mínimo, porque isso seria uma bela vitória no encontro dos géneros.


josé lopes

maputo, novembro 2003

novembro 2003